Especial Coronavírus
Contratos de trabalho
Saiu a principal medida do governo até aqui, depois de uma primeira tentativa desastrada, para endereçar as empresas que estão pressionadas em suas folhas de pagamento diante da crise e as pessoas que podem vir a perder o emprego nas próximas semanas se nada for feito. A medida, no entanto, enquanto autoriza empresas a suspenderem contratos de trabalho por até 60 dias e a reduzirem jornadas de trabalho (com correspondente redução de salários) por até 90 dias, não garante a cobertura integral de salários para um grande contingente de profissionais - especialmente aqueles empregados por micro e pequenas empresas, justamente as que tendem a ter menos margem de manobra. Empregados, mesmo de grandes empresas, que tenham salário na casa dos R$ 5 mil para cima, terão redução salarial de mais de 30% - mesmo com a ajuda do governo e uma complementação obrigatória imposta a médias e grandes empresas que decidam suspender contratos. Abaixo, os principais pontos da medida. Real Oficial.
O Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, como foi batizado, vai valer durante o estado de calamidade pública. Ou seja, nesse período, as empresas poderão, a qualquer momento, optar pela suspensão dos contratos ou pela redução de jornada (desde que respeitados os dias máximos previstos). As empresas poderão inclusive acumular, num período máximo de 90 dias, redução de jornada e suspensão de contrato. O programa não afeta servidores e empregados públicos, inclusive de estatais.
O benefício emergencial será pago mensalmente aos afetados, pelo tempo que durar a suspensão de seu contrato ou a redução de sua jornada. A primeira parcela será paga 30 dias depois da celebração do acordo com a empresa, que precisa necessariamente ser informado ao Ministério da Economia. Esse dinheiro não será uma antecipação do seguro-desemprego, como chegou a ser cogitado anteriormente. É um dinheiro extra, mas que, dependendo do caso, pode representar um percentual bem reduzido comparado com o salário regular do empregado.
O valor do benefício é polêmico, pra dizer o mínimo. A base de cálculo será o valor mensal do seguro-desemprego ao qual o trabalhador teria direito (que leva em conta sua média salarial), e não o salário corrente. Vale lembrar que o valor do seguro-desemprego não é o mesmo que o salário. O valor máximo pago em parcelas do seguro-desemprego é de R$ 1.813,03, válido para quem tem média salarial superior a R$ 2.666,29. O que ficou definido agora pelo governo é que, em caso de suspensão de contrato por até dois meses, o trabalhador receberá o valor integral correspondente à parcela do seguro-desemprego a que teria direito. Se a opção do empregador for pela redução de jornada, hipoteticamente de 50%, então o trabalhador receberá metade do que teria direito no seguro-desemprego. Um exemplo prático: se eu ganho R$ 5 mil numa pequena empresa (faturamento de até R$ 4,8 milhões em 2019) e tenho meu contrato suspenso por dois meses, eu receberei R$ 1.813,03 por mês nesse período de suspensão (36% do salário). Se eu ganho R$ 8 mil, o valor será o mesmo, mas agora correspondendo a apenas 22,6%. Se o meu salário for menor, de R$ 2.500, receberei nesse período de contrato suspenso receberei R$ 1.729,88 (70% do meu salário original).
Uma exceção importante é para o caso de trabalhadores contratados em empresas de médio e grande porte (com faturamento bruto superior a R$ 4,8 milhões no ano passado). Nesses casos, a suspensão do contrato de trabalho só será permitida se a empresa pagar 30% do valor do salário do empregado. Esse percentual seria ainda complementado por 70% do valor do seguro-desemprego ao qual a pessoa teria direito. Assim, por exemplo, se eu tenho salário de R$ 10 mil numa grande empresa, eu receberia, durante a suspensão do meu contrato de trabalho, um total de R$ 4.269 por mês (R$ 3.000 + R$ 1.269) - menos da metade, portanto, do meu salário original. Mas se a grande empresa optar pela redução de jornada, não será obrigada a pagar nenhuma complementação.
Ficará a critério de cada empresa definir se será paga uma ajuda compensatória mensal ao empregado que tem o contrato de trabalho suspenso, para além do que será pago pelo governo. As únicas categorias de empresas que são obrigadas a pagar um valor adicional (30% do salário) nesses casos são, como citado acima, as médias e grandes empresas. O valor dessa eventual ajuda adicional, que já era prevista na outra MP, deve ser definido em acordo individual.
Quanto à redução da jornada de trabalho, ela poderá ser feita, via de regra, respeitando três faixas específicas: 25%, 50% ou 70% de redução da jornada. A exceção é para acordos fechados em negociação coletiva, que poderão validar percentuais diferentes. Nesses casos, o trabalhador que tiver sua jornada de trabalho (e salário) reduzida em menos de 25% não terá direito ao benefício do governo. Se a redução for de até 50%, o percentual a ser aplicado sobre o valor do seguro-desemprego será sempre de 25%. A mesma lógica se aplica a redução de jornada inferior a 70%, mas acima de 50%: o percentual sobre o seguro-desemprego será de 50%.
Só serão admitidos acordos individuais, tanto para suspensão de contrato quanto para redução de jornada, com trabalhadores que recebam até R$ 3.135 ou com trabalhadores com diploma universitário e que tenham salário de pelo menos R$ 12.202,12. Os empregados que não se enquadram nesses critérios devem ter seus casos contemplados apenas em acordos coletivos (exceto para redução de 25% da jornada de trabalho).
As empresas que aderirem a esse sistema deverão manter empregados os funcionários afastados pelo mesmo período de tempo da suspensão do contrato ou da redução da jornada. Por exemplo, um trabalhador que tenha seu contrato suspenso por 60 dias terá direito a outros 60 dias de vínculo garantido com a empresa. Se houver demissão sem justa causa nesse período de garantia, a empresa deverá pagar 100% do salário que o trabalhador teria direito nessa fase (no caso de ter havido suspensão de contrato de trabalho ou redução de mais de 70% da jornada). Há ainda indenizações previstas correspondentes a 50% e 75% do salário, dependendo do tamanho da redução da jornada.
Os empregados com contrato de trabalho intermitente terão direito a três parcelas fixas de R$ 600, com a primeira parcela sendo paga em 30 dias a contar de hoje. Se a pessoa tiver mais de um contrato de trabalho intermitente em vigor, não haverá pagamento de benefício extra.
Há pendências de ordem técnica para que esse sistema emergencial comece a funcionar de fato. O Ministério da Economia ainda terá que definir como essas informações deverão ser prestadas para o governo, e também como funcionará a “concessão e pagamento” do benefício emergencial.
Para registro. Ontem, ao anunciar a medida, o ministro Paulo Guedes disse o seguinte: “São R$ 51 bilhões do nosso programa trabalhista que dão às empresas várias possibilidades, como reduzir jornada em 20%, 25%, 30% e o governo cobre essa diferença de salário”. Mentira, já a começar pelos 20%. Se houver redução de jornada de 20%, o governo não pagará um centavo. Se houver redução de 30%, o trabalhador vai receber 25% do que teria direito no seguro-desemprego. Isso não completa o salário, apenas atenua o corte.
Não dá para negar que o governo abriu finalmente o bolso nesse caso, embora não o suficiente. Foi aberto um crédito extraordinário de R$ 51,6 bilhões para bancar esses benefícios emergenciais, compensado pelo aumento da dívida pública federal interna. Real Oficial.
Mobilização de profissionais
Medida ampla e importante do Ministério da Saúde. O ministro Luiz Henrique Mandetta determinou que todos os profissionais da área de saúde devem realizar cursos de capacitação para o combate à epidemia. Os conselhos de 14 categorias profissionais devem enviar ao governo o cadastro com os dados pessoais de todos os já registrados, de forma a permitir uma ampliação das ações de controle sobre o coronavírus. A medida vale para assistentes sociais, biólogos, biomédicos, profissionais de educação física, enfermeiros, farmacêuticos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, médicos, veterinários, nutricionistas, dentistas, psicólogos e técnicos em radiologia. Esse registro nacional a ser enviado ao Ministério da Saúde poderá ser consultado pelos Estados e municípios em caso de necessidade. A portaria não define expressamente se estas pessoas vão trabalhar nas unidades de saúde durante a crise, nem de que maneira isso aconteceria, mas a medida é justificada pelo ministro pela "necessidade de mobilização da força de trabalho em saúde". Real Oficial.
Os profissionais devem preencher e manter seus dados atualizados em cadastro do ministério. Depois desse registro, eles terão acesso ao curso virtual para ficarem habilitados a trabalharem em ações contra o coronavírus. O governo também deve informar aos conselhos quais são os profissionais que não concluíram o curso de capacitação e os que não atenderam ao chamado para realizar o cadastro nacional. O texto da portaria não determina a obrigação do registro e realização do curso, mas com estas duas ações de relacionar os que não cumprirem estas regras, tenta forçar uma participação pelo menos de sobreaviso dos profissionais que, normalmente, não estão na linha de frente dos hospitais mas podem engrossar o contingente, especialmente com o aumento de infectados entre médicos e enfermeiros.
Impostos
O presidente Jair Bolsonaro publicou decreto reduzindo a zero a cobrança do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) a partir de amanhã até o dia 3 de julho para uma série de operações de crédito. Entre elas, empréstimos e financiamentos contratados por pessoas físicas, e empréstimos e financiamentos de micro e pequenas empresas até o limite de R$ 30 mil. Compras de imóveis não residenciais, quando o comprador é pessoa física, também ficam isentas temporariamente do imposto. O imposto cobrado sobre compras no exterior permanece inalterada. O custo da operação, segundo o anúncio do governo, será de R$ 7 bilhões. O IOF também fica zerado sobre operações de crédito que têm a previsão de alíquota adicional de 0,38% no IOF. Entre elas, empréstimos rurais (investimento, custeio e comercialização) e financiamentos de obras públicas. Real Oficial
O governo também zerou a cobrança de IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) de artigos de laboratório ou de farmácia, luvas (exceto as que são usadas em cirurgias), mitenes (luva que cobre apenas metade da mão) e termômetros clínicos. A medida vale até 1º de outubro, quando devem ser aplicadas as alíquotas já cobradas em decreto de dezembro de 2016. Real Oficial.
Como já vinha sendo ventilado, a Receita Federal oficializou o adiamento por dois meses do prazo de entrega da declaração do Imposto de Renda. A data final mudou de 30 de abril para 30 de junho. O pagamento integral do imposto ou de suas parcelas também tem novas datas. A mudança é sobre a quitação do imposto por meio de débito automático em conta corrente, permitido apenas para declaração de ajuste anual ou retificadora. Pode ser efetuado até o dia 10 de junho para cota única ou a partir da 1ª parcela. E entre 11 de junho e o último dia do prazo (30 de junho) a partir da 2ª cota. Também está dispensada a apresentação do recibo de entrega da última declaração para permitir a transmissão do novo documento pela internet no sistema da Receita. Real Oficial.
Escolas
A Medida Provisória dispensa as escolas de educação básica e as instituições de ensino superior de cumprirem o mínimo de 200 dias letivos anuais, regra prevista na LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação). No ensino fundamental e médio, tanto nas escolas públicas e privadas, a medida vale desde que sejam realizadas a carga horária mínima anual de 800 horas de aula por ano. Ou seja, abre espaço para que essa contagem seja cumprida por aulas não presenciais diante do fechamento das escolas em razão da pandemia do coronavírus. Nas universidades, poderá ser reduzida a duração dos cursos de Medicina, Farmácia, Enfermagem e Fisioterapia. A condição é que os alunos dessas graduações, no caso de Medicina, tenham 75% da carga horária no regime de internato e no mesmo percentual para os demais cursos da área de saúde nos estágios obrigatórios. Real Oficial
Testes
A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) decidiu suspender por seis meses as previsões do regulamento técnico que deve ser seguido pelos laboratórios federais de defesa agropecuária. As normas valem desde 2005. Essas unidades, administradas pelo Ministério da Agricultura, serão adaptadas para realizar testagens do novo coronavírus. Apesar da decisão, a agência determina que esses laboratórios devem seguir, assim como os demais, os requisitos técnicos para garantir a qualidade e a segurança das análises para o diagnóstico da Covid-19. O prazo poderá ser renovado pelo mesmo período enquanto durar a emergência em saúde decretada pelo governo federal. Real Oficial
Setor energético
O Ministério de Minas e Energia criou três comitês de acompanhamento da evolução do Covid-19, abarcando, cada um deles, um segmento estratégico dentro da pasta. A Secretaria de Geologia, Mineração e Transformação Mineral vai coordenar para articular as demandas relacionadas à cadeia produtiva mineral. A Secretaria de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis vai ficar responsável pelo comitê focado no abastecimento de combustíveis, enquanto a Secretaria de Energia Elétrica ficará responsável pelos impactos da crise no fornecimento de energia elétrica. Os comitês devem elaborar relatórios executivos semanais, a serem entregues ao ministro, indicando as reuniões realizadas durante a semana e os encaminhamentos dados, os pontos de atenção e as questões que serão tratadas na semana seguinte. Real Oficial.
Edição produzida com Lúcio Lambranho.