Brasil Real Oficial - Especial Posse de Armas
Uma análise pontual do Decreto que facilita a posse de armas no Brasil
Olá!
Como a próxima newsletter completa só sai na sexta-feira, decidi antecipar a análise do conteúdo do Decreto que foi assinado agora há pouco pelo presidente Jair Bolsonaro e que abre a porteira para a posse de armas no Brasil.
Decreto Wild Wild Country
O essencial: Bolsonaro deu um drible no Congresso e, com uma canetada, mudou muito das regras vigentes desde 2004 para cidadãos comuns possuírem armas no Brasil. A partir de hoje à tarde (terça-feira, dia 15 de janeiro de 2019), qualquer pessoa sem antecedentes criminais, que não tenha problemas mentais e que consiga segurar uma arma sem apontar descuidadamente para a própria cabeça, poderá ter em sua casa ou em sua padaria, mercadinho, açougue, salão de beleza ou loja de material de construção até quatro armas de fogo de qualquer calibre (desde que não seja de uso restrito). Como manusear quatro armas de fogo para autodefesa, bem, isso aí o decreto não explica.
OBS: Numa primeira versão, considerei que o decreto atingiria apenas municípios com taxa de homicídios acima de 10 por 100 mil habitantes. Mas, na verdade, essa taxa é referente às unidades da Federação. Ou seja, o decreto abrange mesmo o Brasil inteiro.
Outras coisas importantes que vale a pena você saber:
Se você já possui uma arma, e mesmo que seu registro expire daqui um mês, fique tranquilo. Zero burocracia. O decreto automaticamente renova sua posse de armas por 10 anos.
O limite de quatro armas pode ser deixado de lado. Se você apresentar ao governo a “efetiva necessidade” de mais armas (cidades com índice de homicídios muito acima da média?), esse limite pode ser ampliado, a priori, de forma indeterminada.
O pedido de registro de armas será indeferido caso fique comprovado (de que forma?) que a pessoa "mantém vínculo com grupos criminosos". Como uma das exigências é apresentação de comprovação de ficha limpa em relação a inquéritos ou processos, essa comprovação de ausência de vínculo com grupos criminosos deve ocorrer, portanto, de forma extrajudicial. A cláusula parece ter endereço certo: pessoas com vínculo com movimentos sociais considerados criminosos pelo governo Bolsonaro, como o MST ou o MTST. Apoio em redes sociais pode representar o “vínculo” citado no decreto?
Antes, era necessário reapresentar documentação de capacidade técnica, aptidão psicológica e de bons antecedentes a cada 5 anos, para renovação de registro. Agora esse intervalo sobe para 10 anos. Nesse período, se a pessoa se envolver com atividades criminosas, o registro dela seguirá válido.
O critério da taxa de homicídios, válido para áreas urbanas, não se aplica a pessoas residentes em áreas rurais. Nesse caso, a posse de até quatro armas (antes era apenas uma) é permitida independentemente do grau de violência da região.
Para proteger crianças e adolescentes do risco de pegar a(s) arma(s) do pai escondido, o decreto define que, na hora do registro, o interessado deve obrigatoriamente declarar 1) se mora com uma criança, adolescente ou pessoa com deficiência mental e 2) se possui um cofre ou “local seguro” com tranca. É mera autodeclaração. Além disso, o conceito de local seguro pode, no limite, incluir um armário ou gaveteiro com chave. A Polícia Federal pode fazer uma verificação in loco quando achar conveniente. Isso, no entanto, não está regulamentado e, se com empresas de segurança privada a fiscalização já é altamente falha, imagine com residências particulares. Mais provável que a fiscalização aconteça somente depois de tragédias. Mesmo nessa hipótese, a punição prevista ao dono do registro é uma multa e regime aberto de até dois anos. Processo por homicídio culposo? Fora de questão.
Real Oficial: Decreto nº 9.685, de 15 de janeiro de 2019 (via Estadão)