Brasil Real Oficial #010
As 7 principais ações oficiais do governo federal | 18 a 22 de março de 2019
Olá! Tudo certo?
Seguem as sete medidas que considerei as mais importantes da semana, para o bem ou para o mal, no governo Bolsonaro.
Os assinantes pagos do Brasil Real Oficial souberam disso tudo ao longo da semana, nos e-mails diários que envio para eles. Tem advogados, empresários, dirigentes de ONGs, jornalistas, pesquisadores, políticos, consultores, estudantes… enfim, todo mundo que quer ficar bem informado todos os dias sobre o que de fato está mudando no país, para além das intenções, dos balões de ensaio, dos tweets, das lives, dos discursos vazios e das fotos protocolares.
Das medidas que estão aí embaixo, você deve ter ouvido falar apenas de uma ou duas na imprensa, né?
Além dessas sete destacadas, outras 31 medidas foram tomadas durante a semana, mas que ficaram de fora da seleção. Para passar a saber quais são todas elas, assine o Brasil Real Oficial.
Estes são os assuntos dessas outras medidas, que foram enviados na versão diária da newsletter: Agronegócio, Aviação, Defesa & Segurança Nacional, Educação, Energia & Meio Ambiente, Importações & Exportações, Infraestrutura & Logística, Organização do Estado, Previdência, Questões Jurídicas, Saúde, Segurança Alimentar, Trabalho e Emprego, Transparência e Prevenção à Corrupção, Turismo e Violência & Criminalidade.
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Um abraço,
Breno (no Twitter, @_brenocosta_)
1) Como criar sanguessugas
O essencial: Em portaria publicada em edição extra na sexta-feira passada, o Ministério da Saúde alterou as regras para liberação de emendas parlamentares que colocam mais dinheiro no SUS, para a realização de transferências para fundos estaduais ou municipais de saúde (transferência fundo a fundo). Uma brecha em potencial é que, nas regras anteriores, cabia diretamente ao Ministério da Saúde fazer a licitação e a distribuição de ambulâncias contratadas via emendas parlamentares. Agora elas devem ser adquiridas "pela gestão local contemplada" - ou seja, pela prefeitura ou pelo governo de Estado. Foi justamente a contratação fraudulenta de ambulâncias por prefeituras que detonou o escândalo dos sanguessugas, um dos mais importantes casos de corrupção descobertos nos anos 2000.
Outros pontos importantes que vale a pena você saber:
A portaria do Ministério da Saúde abre margem também para que as prefeituras comprem ambulâncias fora da ata de registro de preços vigente no Ministério da Saúde, desde que "se demonstre a vantajosidade econômica da aquisição".
A portaria também muda regras para a aprovação de projetos para aquisição, com dinheiro de emendas parlamentares, de vans, ônibus e barcos para transporte de pacientes para procedimentos eletivos. O mesmo vale para a aquisição de ambulâncias tipo A (as mais simples, para transporte de pacientes em risco de morrer). A principal diferença é que agora fica definido que cabe ao Departamento de Atenção Básica a aprovação do projeto e que ele precisa ter sido previamente aprovado pela Comissão de Gestores Bipartite no máximo seis meses antes da apresentação do projeto.
No caso das ambulâncias tipo A, também dobra o número de veículos para os quais passa a ser permitido o financiamento via emendas, já que entra no pacote também a aquisição de ambulâncias aquáticas (para transporte em rios, por exemplo).
Real Oficial: Portaria nº 395, de 14 de março de 2019
Compartilhe: Ministério da Saúde muda regras e recria sistema que permitiu o escândalo dos sanguessugas. Saiba mais na newsletter Brasil Real Oficial: http://lnnk.in/@realoficial010
2) Faxina de conveniência
O essencial: O presidente Jair Bolsonaro definiu um conjunto de critérios objetivos para a ocupação de cargos comissionados em seu governo, inclusive dos já preenchidos. Para os cargos de alto escalão (DAS 5 e 6 e funções equivalentes), será necessária experiência prévia de cinco anos em área relacionada àquela do cargo a ser ocupado, ou ter exercido cargo de confiança em qualquer esfera de governo por pelo menos três anos em cargo de escalão médio, ou, então, ter mestrado, doutorado ou especialização em áreas relacionadas ao cargo. As exigências seguem essa lógica para os escalões mais baixos, mas com períodos de experiência prévia menores. A lógica da ficha limpa também se aplica a todos os casos.
Brecha em potencial:
Os critérios acima, no entanto, poderão ser desconsiderados a pedido do ministro responsável pelo órgão, mediante justificativa que "demonstre a conveniência de dispensá-los em razão de peculiaridades do cargo ou do número limitado de postulantes para a vaga". Só o ministro pode fazer essa dispensa, sem possibilidade de delegação de poderes.
Outros pontos importantes que vale a pena você saber:
As regras valeriam apenas para as nomeações efetuadas a partir de 15 de maio. Mas, depois de grita de parlamentares que viram uma janela para tratamento discriminatório, o governo cedeu e decidiu incluir, em um novo decreto, todos os comissionados nas novas exigências – inclusive os já nomeados pelo governo. Em tese, portanto, está ativado um potencial processo de expurgo e com data definida para terminar: 20 de junho. Até essa data, serão mandados embora todos aqueles que não se enquadrarem nas regras do decreto.
A partir de janeiro de 2020, os órgãos federais terão de manter atualizado o perfil profissional desejado para cada cargo em comissão, seguindo os critérios definidos no decreto e também um modelo a ser definido pelo Ministério da Economia.
Os órgãos do governo também terão de divulgar, a partir de janeiro, "de forma organizada e em formato aberto", o currículo dos ocupantes de cada cargo em comissão ou função de confiança.
Real Oficial: Decreto n 9.727, de 15 de março de 2019 e Decreto nº 9.732, de 20 de março de 2019
Compartilhe: Bolsonaro define critérios para cargos comissionados, amplia alcance, mas deixa brecha aberta pra que regra seja ignorada. Saiba mais na newsletter Brasil Real Oficial: http://lnnk.in/@realoficial010
3) Efeito prático desaparecido
O essencial: Bolsonaro sancionou uma lei bem intencionada, mas que dificilmente será aplicada integralmente no futuro próximo. Trata-se da instituição de uma Política Nacional de Busca de Pessoas Desaparecidas. Pelo texto aprovado, proposto originalmente pelo ex-deputado Duarte Nogueira (PSDB-SP), a lei define um sistema integrado entre governo federal e governos estaduais para controle automático e imediato de casos de pessoas desaparecidas, de todas as idades. A lei cria, também, um Cadastro Nacional de Pessoas Desaparecidas. Um dos problemas é que um cadastro semelhante já foi instituído, também por lei, em 2009, mas sempre se mostrou falho. Um dos argumentos para os problemas (hoje está fora do ar e a apresentação disponível no Ministério da Justiça é absolutamente precária) é que não havia essa política nacional. O outro problema é que o governo Bolsonaro não está interessado em seguir com isso à frente. Veja por quê:
Apesar de a lei entrar em vigor de imediato, ela ainda precisa ser regulamentada em vários pontos. Mas o presidente Jair Bolsonaro vetou artigo que definia um prazo de 90 dias para essa regulamentação, alegando que esse prazo fere o princípio da harmonia e separação de Poderes. O único ponto que já passa a valer na prática é que menores de 16 anos agora só podem viajar desacompanhados de responsáveis, dentro do país ou mesmo dentro do Estado para cidades mais distantes, com autorização judicial. Até aqui, essa exigência era apenas para menores de 12 anos.
No dia em que o texto foi aprovado no Senado, em fevereiro, o governo tentou tirar o projeto de pauta. O líder do governo, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), foi acionado para fazer a manobra, mas não funcionou.
No texto da lei aprovada, qualquer pessoa "cujo paradeiro é desconhecido" é considerada pessoa desaparecida. Isso vale "até que sua recuperação e identificação tenham sido confirmadas por vias físicas ou científicas". Ou seja, estão incluídos aqui a descoberta de restos mortais, ossadas etc. Vale para desaparecidos na ditadura militar, que, passariam, então, a ter suas características descritas no tal Cadastro Nacional. Como se trata de uma lei que vai trazer à tona casos da época da ditadura militar, tema caro ao presidente Bolsonaro, é provável que a regulamentação disso ainda demore bastante - até porque já existe, embora falho, um cadastro nacional criado.
Outros pontos importantes que vale a pena você saber:
A lei prevê que a investigação deverá transcorrer até que a pessoa seja efetivamente localizada. Ou seja, não pode haver encerramento formal das investigações ou arquivamento dos casos até que a pessoa seja encontrada - viva ou morta.
Hospitais e clínicas, mesmo privados, deverão informar as autoridades no caso de cadastro de pessoas sem a devida identificação em suas dependências.
As buscas devem ser feitas "preferencialmente por órgãos investigativos especializados", o que abre espaço para a necessidade de criação de órgão específicos para isso tanto no governo federal como em grande parte dos estados.
O novo Cadastro Nacional de Pessoas Desaparecidas deverá ter, quando criado, uma versão de acesso público com informações sobre característica físicas das pessoas, fotos e "outras informações úteis" para a identificação delas. Uma outra parte será sigilosa, restrita aos órgãos de segurança pública, como informações genéticas e dados de boletim de ocorrência.
O governo fará convênios com TVs e rádios para divulgação de "alertas urgentes" sobre desaparecimento de crianças e adolescentes - mas somente nos casos em que "houver informações suficientes para a identificação e a localização da criança ou do adolescente desaparecido ou do suspeito". A mensagem não será exibida se isso for comprometer a segurança da criança ou atrapalhar as investigações.
A participação da sociedade civil é prevista "na formulação, na definição e no controle das ações da política" de busca de pessoas desaparecidas. Está prevista a participação, "entre outros", representantes de órgãos de segurança pública, direitos humanos e defesa da cidadania, dos institutos de identificação e IMLs, do Ministério Público, da Defensoria Pública, da Assistência Social, dos “conselhos de direitos com foco em segmentos populacionais vulneráveis” e dos conselhos tutelares. Um grupo bem diversificado, o que soa estranho às ações do governo até aqui.
Real Oficial: Lei nº 13.812, de 16 de março de 2019
Compartilhe: Lei sobre pessoas desaparecidas é sancionada, mas Bolsonaro veta prazo para colocar medidas em prática. Por ora, único efeito prático é proibição de viagem de menor de 16 anos. Saiba mais na newsletter Brasil Real Oficial: http://lnnk.in/@realoficial010
4) Acesso a sigilo bancário
O essencial: A Controladoria-Geral da União atualizou as regras para acesso de seus servidores e diretores a dados de sigilo bancário quebrados em investigações conduzidas pelo órgão - inclusive em acordos de leniência. Uma novidade é que, na solicitação de quebra de sigilo bancário, é possível indicar não apenas os investigados, mas agora também "eventuais terceiros que sejam de interesse para a investigação". Pode abrir espaço para parentes terem sigilo quebrado.
Outros pontos importantes que vale a pena você saber:
Os detentores de perfil Chefia terão poderes para autorizar decidir sobre o pedido de afastamento de sigilo - e encaminhar o pedido à Justiça. São eles os diretores da CGU como um todo e mesmo os superintendentes regionais do órgão. Além disso, terão poderes para iniciar investigações e autorizar que outros servidores acessem esses dados sigilosos.
Real Oficial: Portaria nº 1.129, de 15 de março de 2019
Compartilhe: CGU poderá ter acesso a sigilo bancário de “terceiros” em investigações. Parentes de investigados, por exemplo. Saiba mais na newsletter Brasil Real Oficial: http://lnnk.in/@realoficial010
5) Prioridades para a saúde
O essencial: O Conselho Nacional da Saúde definiu, em reunião realizada em fevereiro e com resolução publicada oficialmente somente nesta semana, as diretrizes que deverão ser seguidas pelo Ministério da Saúde na definição das prioridades para as ações e serviços públicos de saúde no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) para o Orçamento de 2020. São 22 itens ao todo e, por serem diretrizes, são mais genéricos do que específicos. Alguns pontos podem gerar polêmica, como a determinação de que o atendimento ao público nas unidades do SUS considere "determinantes sociais" como a "identidade de gênero" - expressão que causa urticária no núcleo conservador do governo. Outras diretrizes ainda poderão ser incorporadas a partir da 16ª Conferência Nacional de Saúde, que será realizada em agosto.
Real Oficial: Resolução nº 614, de 15 de fevereiro de 2019
Compartilhe: Prioridades definidas por Conselho Nacional da Saúde, em linha dissonante do governo Bolsonaro, prevê respeito à “identidade de gênero” em atendimentos em unidades do SUS. Saiba mais na newsletter Brasil Real Oficial: http://lnnk.in/@realoficial010
6) Cursos de engenharia reformulados
O essencial: O Conselho Nacional de Educação modernizou significativamente as diretrizes curriculares dos cursos de Engenharia, vigentes desde 2002. A partir da homologação pelo ministro da Educação, que ainda não aconteceu, as faculdades terão dois anos para se adaptarem às novas regras. Aos interessados, vale ler o parecer completo, de janeiro deste ano, com uma contextualização bem interessante do estado da arte do ensino de engenharia no país. A avaliação do CNE é que "não foi possível colher os avanços esperados com o texto em vigor, uma vez que seu embasamento em núcleos de conteúdos acabou por determinar currículos com foco, principalmente, no desenvolvimento de conteúdos e práticas, muitas vezes restritas a laboratórios, em disciplinas estanques e geralmente descontextualizadas". Há diversos pontos de destaque nas novas regras, mas acho que um ponto essencial é uma flexibilização muito maior para os cursos inovarem em seus modelos de formação, e com direcionamento de foco para aspectos práticos e de empreendedorismo. Seguem alguns destaques:
Depois de formado, o novo profissional deverá ter seu desenvolvimento acompanhado pela faculdade, com a promoção "sistemática de um processo de avaliação do egresso, de forma a acompanhar sua trajetória, inclusive profissional, nos primeiros cinco anos da diplomação, pelo menos".
Hoje, as diretrizes definem o conteúdo de cada núcleo de formação e a proporção deles dentro dos cursos. O núcleo básico, por exemplo, deve responder por 30% da carga horária mínima e 15 tópicos/disciplinas previamente definidos. Outros 15% da carga horária devem ser destinados a conteúdos profissionalizantes, a partir de 53 tópicos que poderiam ser selecionados pelas instituições. O restante, 55% da carga horária, são tópicos complementares de livre definição pelas instituições de ensino, para aprofundamento dos tópicos do núcleo profissionalizante. Com as novas diretrizes, não existem mais os núcleos, nem as cargas horárias mínimas, nem os tópicos pré-definidos. A organização do curso se dará em "eixos de conteúdo, temas, blocos" ou as tradicionais disciplinas. A ideia é que, dessa forma, "os conteúdos sejam implementados dentro de contextos de desenvolvimento de competências e contextualizados em ambientes de Engenharia, e não apenas como um fim em si mesmos".
Do total das disciplinas/eixos do curso, 30% deverão envolver atividades práticas, que deverão corresponder a pelo menos 20% do conteúdo previsto em cada uma delas. Além disso, o estágio obrigatório, que hoje deve ser de no mínimo 160 horas, praticamente dobra: 300 horas, no mínimo. E, dentro da lógica do estágio, as faculdades "devem estabelecer parceria com organizações que desenvolvam ou apliquem atividades de Engenharia, de modo que docentes e discentes do curso, bem como profissionais destas organizações, se envolvam efetivamente em situações reais que contemplem o universo da Engenharia, tanto no ambiente profissional quanto no ambiente do curso".
Os cursos devem "estimular atividades acadêmicas tais como trabalhos de iniciação científica, projetos multidisciplinares e transdisciplinares, visitas técnicas, trabalhos em equipe, desenvolvimento de protótipos, monitorias, participação em empresas juniores e outras atividades empreendedoras". Também "é desejável" que as faculdades estimulem o voluntariado na área de engenharia.
Passa a ser "desejável" que parte dos professores do curso não se restrinjam a engenheiros, pegando profissionais de outras áreas.
Real Oficial: Súmula de Parecer CNE/CES nº 1/2019
Compartilhe: Novas regras para cursos de engenharia preveem verificação do desenvolvimento do aluno mesmo 5 anos depois de formado. Conheça outras mudanças na newsletter Brasil Real Oficial: http://lnnk.in/@realoficial010
7) A nova educação
O essencial: O Ministério da Educação está praticamente paralisado, imerso numa crise de poderes, mas a Capes, instituição vinculada à pasta, tem promovido mudanças significativas nas últimas semanas. Nesta semana, a comissão acabou com o Programa Demandas Espontâneas (PDES), criado em 2016 e que permitia a apresentação, por estudantes e pesquisadores, de pedidos de financiamento de projetos de pesquisa em outros países, bolsas individuais (incluindo doutorado-sanduíche e pós-doutorado no exterior) e auxílio para participação em eventos ao redor do mundo. O objetivo do programa, dessa maneira, era apoiar iniciativas que não são "provocadas" previamente pelo governo via editais ou chamadas públicas - daí o termo "demandas espontâneas". A portaria, como é praxe, não explica o motivo do cancelamento, mas diz que houve "necessidade de revogação do instrumento legal e dos procedimentos de análise". Para os que já estão usufruindo dos benefícios, ficam valendo os termos assinados com a Capes para o financiamento, e as propostas já apresentadas, mas ainda pendentes de resultado, seguirão sob análise.
Real Oficial: Portaria nº 59, de 20 de março de 2019
Compartilhe: Em meio a crise no Ministério da Educação, governo acaba com programa de incentivo financeiro a projetos de pesquisa, bolsas e participações em eventos no exterior. Saiba mais na newsletter Brasil Real Oficial: http://lnnk.in/@realoficial010